Quando ouvimos falar em biotecnologia, pensamos logo nas técnicas modernas de
manipulação do DNA, como a engenharia genética e as sementes transgênicas.
Contudo, a biotecnologia é muito mais antiga: há muito tempo o ser humano
manipula microrganismos, criando produtos como o vinho e outras bebidas
alcoólicas e o pão. Além, é claro, de vários antibióticos. E os fungos estão
entre os principais microorganismos a nosso serviço.
Os fungos alimentam-se de substâncias orgânicas de folhas mortas, de
cadáveres e de resíduos. Eles realizam a decomposição dessas substâncias e,
dessa forma, contribuem para a reciclagem da matéria no planeta.
Algumas de suas formas são unicelulares, como o levedo. A maioria, porém, é
formada por várias células, como os conhecidos cogumelos - alguns deles são
muito apreciados na culinária; outros, porém, produzem substâncias venenosas. E
somente especialistas podem identificar se um fungo é tóxico ou não.
Os fungos podem ser aeróbios - quando utilizam o gás oxigênio do ar para
liberar energia do alimento - ou anaeróbios, quando realizam um processo chamado
fermentação. Na fermentação, os fungos conseguem energia sem utilizar oxigênio.
E é justamente nesse processo que diversos produtos úteis ao ser humano são
fabricados.
Uma curiosidade: a maior forma de vida da Terra parece ser um fungo gigante
com uma enorme rede de filamentos que se estende embaixo da terra, abrangendo
uma área equivalente a 47 estádios do Maracanã.
A produção de álcool e pão
Na produção de álcool, de pão e de bebidas alcoólicas usamos um fungo
conhecido como levedo (Saccharomyces cerevisiae). O processo é chamado de
fermentação alcoólica e libera, além do álcool, gás carbônico (esse gás pode ser
mantido na bebida, como no champanhe e na cerveja).
O vinho é produzido a partir da fermentação do açúcar da uva; a cerveja
resulta da fermentação da cevada; a cachaça tem origem na fermentação da
cana-de-açúcar.
O fungo morre quando o nível de álcool chega a cerca de 12%. Por isso, no
caso de bebidas de alto teor alcoólico, este nível é aumentado por meio da
destilação.
O levedo é encontrado também no fermento de padaria e faz crescer a massa do
pão pela produção de gás carbônico. As bolhas desse gás fazem a massa ficar
fofa. Tanto o álcool como o gás carbônico acabam sendo eliminados da massa pelo
calor do forno.
Alguns fungos defendem-se de predadores através da produção de substâncias
químicas que matam ou inibem o crescimento de bactérias e outros seres vivos.
Algumas dessas substâncias são usadas na produção de antibióticos.
Antibióticos e outros medicamentos
O primeiro antibiótico foi descoberto pelo cientista escocês Alexander
Fleming (1881-1955). Fleming estava cultivando bactérias em placas de vidro
quando observou que uma das placas tinha sido contaminada por fungos. Ele
observou também que as bactérias não cresciam ao redor da região onde estava o
fungo.A partir dessa observação, Fleming pode verificar que o fungo, da espécie
denominada Penicillium, tinha a propriedade de inibir a reprodução das
bactérias. Estava aberto o caminho para produção da substância
denominada penicilina.
Muitos medicamentos são extraídos de fungos. Por exemplo: a ergotamina, usada
para controlar sangramentos e estimular contrações musculares no parto; a
ciclosporina, que reduz as reações imunológicas do corpo e é, por isso,
importante nos transplantes de órgãos.
E, embora as bactérias sejam as preferidas para a produção de medicamentos
pela engenharia genética, cientistas norte-americanos conseguiram fazer
recentemente com que o levedo produzisse proteínas para fins terapêuticos
semelhantes às proteínas humanas, utilizando as mesmas técnicas de engenharia
genética.
Bioinseticidas
Os fungos também podem ser usados como controle ou combate biológico, uma
técnica de combate a pragas. Por meio de seleção e melhoramento genético,
pesquisadores da Universidade de São Paulo conseguiram espécies (Metarhizium
anisopliae e Beauveria bassiana) que parasitam e matam insetos que
atacam as plantações no Brasil. A vantagem do combate biológico é que ele é mais
específico que os agrotóxicos: os insetos úteis (como os polinizadores e os
predadores das pragas), além de outros animais, não são afetados por eles.
Fungos versus ser humano
Fungos podem ser benéficos ao ser humano, mas também podem trazer prejuízos.
Eles atacam plantações, destroem alimentos estocados, roupas, papéis, couro e
outros produtos. E há ainda fungos parasitas que se instalam em nosso corpo e
causam doenças - as micoses, como a frieira, a candidíase (o popular "sapinho"),
entre outras.
Os fungos do gênero Aspergillus, por exemplo, produzem
substâncias tóxicas, as aflatoxinas, que podem provocar câncer de fígado no ser
humano. Eles podem se desenvolver em alimentos armazenados em locais úmidos,
como milho, trigo e amendoim. Por isso, uma vigilância sanitária constante é
necessária, a fim de detectar os níveis de aflatoxina nesses produtos.
Preservar a biodiversidade
Do ponto de vista da ciência, a natureza não existe para servir ao ser
humano. Fungos, assim como todos os organismos do planeta, apresentam adaptações
que permitem sua sobrevivência e reprodução. Muitos fungos produzem substâncias
tóxicas para combater outros seres vivos. Muitas dessas substâncias acabam sendo
transformadas em medicamentos para o ser humano. Assim, embora não houvesse
nenhuma "intenção" por parte do fungo (ou de qualquer outro ser vivo) de nos
ajudar, é isso que acaba acontecendo em muitos casos: basta pensar nas vidas
salvas pelos antibiótiocs. A conclusão é que preservar a biodiversidade do
planeta é preservar também a espécie humana.
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